quarta-feira, 17 de dezembro de 2008

O Paradoxo dos calçados femininos I

O cadáver de Rachel tinha chego fazia 2 dias à Funerária Scavone. O enterro seria na manhã seguinte. Por isso os cigarros não podiam faltar um instante sequer. Décio estava um pouco desconfortável com a situação lúdica apresentada. Despir e vestir o corpo de seu amor antigo congelado pelo rigor mortis devia ter alguma relevância no top 5 de coisas esquisitas para se fazer na vida. Impetuosamente a causa mortis havia transcendido o seu entendimento como aspirante frustrado da medicina - Cirrose Hepática. Quem mais morre de cirrose hj em dia? - Décio perguntava para si coçando a cabeça. No entanto, apesar da situação bizarra, o q mais intrigava Scavone eram os sapatos de Rachel. Qdo a tia avó da judia havia lhe entregado o corpo, Décio buscava algo de errado ao conjunto requintado da ruiva paralisada. O q estava incoeso? - A resposta era visualmente simples. Rachel nunca teria comprado sapatos azuis de salto alto. Nunca! Isto seria uma manifestação burguesa fantasmagórica aos ideais da comuna. Ela deveria estar usando algo como sandálias de couro cru ou rasteirinhas vermelhas que lhe eram favoritas. Obviamente a tia avó Vinsberg havia profanado o santuário comunista que Rachel representava - lhe impondo... infectando - num momento de disfunção hepática o scarpan azul. Crueldade pura aos ideais radicais da menina - não poderia ficar impune esta deflação de praxis. Prontamente, ao preparar o cadáver, Décio retirou carinhosamente o salto alto aveludado, importando aos pés delicados de rachel a rasteirinha genérica de cor vermelha para enredar os passos comunais de seu descanso eterno. Era necessária esta reformulação ideológica antes do rito de despedida final rumo ao céu stalinista. A garoa fina começava a coroar Décio qdo a luz da Conveniência Sodderberg aparecia no alto - Estes judeus vão dominar o mundo! - resmungava Décio.

Taxidermia Radical II

Foi um escorão do acaso Décio ter entrado para o clube. Rachel Vinsberg era o nome pecaminoso da ruiva escultural q envolvia um punhado de estudantes sem rumo para a fanática Taxidermia Marxista. Vestidos indianos mal lavados e sem dignidade com caimento perfeito em seu corpo grego róseo. Um cheiro forte de Dama da Noite misturado com cinzeiro amanhecido que atrairia o mais cético simpatizante fascista a uma revolução de conceitos filosóficos. "As pessoas bonitas tem q se esforçar menos na vida para atingir objetivos q pessoas feias nunca sonharão alcançar" - disse uma vez, sabiamente a professora Laura Rios das entediantes aulas de Holística Racional Kantiana de sexta feira à noite. A ruiva era assim. dotada de uma paixão sem limites por Valério Dantas e cobiçada por todo o movimento estudantil q, obviamente, desejava descobrir a todo custo se a garota bruxa havia nascido naturalmente revolucionária e se naturalmente lhe cresciam cabelos de fogo pelos poros pubianos. Os boateiros despeitados eclodiam nos motivos q levavam Dr. Dantas a não assumir seu romance ilícito com Rachel - "Ele empalha cadáveres, mas teme ser rotulado anti-ético?" - enfatizavam as péssimas línguas do submundo. Uns diziam que a origem judia da menina ia contra os ideais comunistas do professor; Outros falavam q os "choques penianos" legados pela ditadura haviam brochado Valério para sempre e, isso era imperdoável no contexto lúdico das fantasias eróticas do quarto ano. A verdade é q não havia verdade alguma; O q embolia um oceano de esperanças aos corações aspirantes da revolução proletária e sexual ao lado de Rachel e q perambulavam cegos pelas sombras da subcultura vermelha. Scavone era um deles. Enlaçado, recomendado pela beleza do Rosh Hashaná feminino e repleto de ideais contra a repressão, o jovem ingressou fielmente no clube e no seu vício eloquente em tabaco. "E dizem q não se aprende nada de útil na universidade" - "Quantos alunos da filosofia sabem empalhar pessoas hj em dia?" - respirava com dificuldade.

quinta-feira, 11 de dezembro de 2008

Taxidermia Radical I

“Os dois quarteirões mais longos de minha existência” – Décio estava btt ofegante. Ofegar e suar como um hidrante de pano costumava acontecer desde os tempos de faculdade. Desde q havia começado a fumar nos anos 80 e, principalmente após ingressar em uma das inúmeras variantes comunistas, guetizadas de maneira enfática pela Universidade de São Paulo (lado a lado em relevância universitária de grupos como pela “Libertação para a aproximação gay” e “Pela legalização da maconha já”). Se lembrou imediatamente do Prof. Dr. Valério Dantas. Homem alto, magro, sempre barbado e de feições bem profundas. Um dos muitos marxistas sectarizados e ridicularizados injustamente pela academia. “Um homem de idéias” – pensava Scavone. As lendas da Usp contavam q o professor Valério, na época, mero militante marxista do curso de Medicina, havia sido preso pelo DOPs como subversivo. Depois disso, como tortura psicológica, o médico foi obrigado a taxidermizar gatos e comunistas para figurões da ditadura. “Eu fui obrigado a empalhar a mão de Che Guevara para sanar os caprichos de um judeu maníaco.” – ele dizia. Repetia pelos cantos da FFLCH – aonde conseguia ouvintes mais inflamados – de maneira obtusa q “A única coisa q os judeus odeiam mais q nazistas são comunistas” – “Não se pode ganhar dinheiro nem xingar empregados em uma comuna”. – Qdo a ditadura acabou, o pobre professor Valério foi exilado definitivamente para as aulas de Anatomia Animal II no menos glamouroso curso de biologia. Foi neste ostrascismo intelectual q o docente herege decidiu criar o “Clube de Taxidermia Radical”. Uma formulação crítica anti Balzachiana. Como perspectiva ideológica inicial, o clube acreditava em algo como preencher a “casca” capitalista da efemeridade física do corpo, recheando-o em feno e pó, demonstrando aos seus membros a alma vazia da propriedade privada – “Sua falta de conteúdo e essência”. Com a ajuda de alguns antigos amigos da Sta. Casa, Valério conseguiu cadáveres clandestinos e o patrocínio da CNPq.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

A Partilha II


"Senhor Scavone, seu pai faleceu" - "Foi atropelado por um piano e morreu na hora" - "Deixou a funerária Scavone aos seus cuidados e uma casa ao seu irmão mais novo". Já estava quase tomando coragem para desistir de chegar à loja de conveniência qdo se lembrou destas frases randômicas proferidas pelo sargento Oliveira. Tossiu, foi tomado pela falta de 4.700 substâncias tóxicas no seu sangue e pela aleatoriedade dos fatos q o estavam perseguindo até o exato momento. Pensou em Papa Léguas e em como tudo era mais fácil qdo não existiam lojas de conveniência e vc podia correr quilômetros no deserto em apenas alguns segundos. "Como o Coiote conseguia chegar sempre a frente da ave corredora para dispor suas armadilhas?" - Tudo teria sido realmente mais simples se Décio tivesse seguido sua promissora carreira acadêmica. Teria sido ainda menos ridículo se ele tivesse escolhido medicina ao invés de filosofia. "O Brasil não precisa de filósofos" - recordava seu pai esbravejando durante o jantar - "Com a violência aumentando exponencialmente, este país vai ter sempre mercado para caixões" - "A morte era um gde negócio no passado e continuará sendo para o futuro" - e seu pai concluia. Por último, imaginou sua vida como a de um Sócrates sem veneno ou a de um Nietsczhe com uma herança paterna q o atrapalhasse de concluir sua canônica epopéia vital. Não adiantava culpar seu pai, no entanto. "Como um piano atropela uma pessoa?" - "Será q um carro estava transportando o instrumento q, mal amarrado, caiu?" – Era uma morte btte particular. Uma família inteira, um legado regido pelos lucros da morte. A vida do grande filósofo, desapontado pelas fiandeiras do destino, Décio Scavone havia se tornado mais "sobre a morte" do q realmente uma sequência de acontecimentos biológicos bem organizados. "Ainda faltam 3 quarteirões" - "Eu devia vender a funerária e abrir uma loja de conveniências" resmungou.

O Barbeiro de Cadáveres - A partilha I

Décio Scavone estava exausto enqto voltava sozinho para seu apartamento. Buscou um cigarro e encontrou um maço vazio no lugar. Recordou da bela moça no metrô q lhe havia implorado por um (inflando seu gigantesco decote) no início da noite. "Se eu tivesse negado" - conjecturou com arrependimento. Está certo q na ocasião do pedido, o maço estava cheio. Porém, hipoteticamente, se tivesse saído por uma outra porta do expresso ele não encontraria o par de peitos e, sua hombridade não estaria posta em jogo por um pouco de nicotina. Nesta linha de raciocínio, ele muito provavelmente não seria sexualmente abordado e ainda teria um bendito cigarro para dormir tossindo ao lado de seus efisemas como todas as noites. Neste instante, Décio se lembrou de uma foto famosa de Gandhi com seu tear e um cigarro no canto da boca como Clint Eastwood. Talvez fosse o próprio Clint e, não fosse um tear e sim uma pistola. Mas o fato era simples - Tanto Gandhi qto o senhor Eastwood não possuiam lojas de conveniência em seus respectivos ambientes de trabalho. Como faziam qdo o cigarro acabava?